Desconstrução do emprego tradicional?

Uma revolução das competências

Texto: Lúcia Palma Imagem: Freepik/ @snowing

Sim, porque agora não somos apenas os nossos empregos ou cargos, somos as nossas habilidades, e a pergunta que se coloca é: será que os empregos tradicionais estão a caminho do museu?

Nos últimos anos, assistimos à ascensão da Gig Economy e dos modelos de trabalho contingente. Quem diria que a ideia de freelancers e trabalho temporário se tornaria algo fashion? É quase como se estivéssemos a ver uma nova série da Netflix sobre trabalho, onde o título seria «Trabalhando sem Emprego». E adivinhem, parece que não é só um swing passageiro; é uma transformação cultural que está a acontecer bem debaixo dos nossos narizes.

Imaginem um mundo onde a capacidade de resolver problemas, comunicar ou inovar vale mais do que o título que se ostenta. Serão as organizações baseadas em competências o novo «Santo Graal» do design organizacional?

É um pouco irónico pensar que, num mundo onde todos estão a correr atrás de uma formação ou de uma nova certificação, estejamos a desmantelar a estrutura organizacional que, por décadas, nos deu algum tipo de status. Porque, sejamos sinceros, nada diz «eu sou alguém» como um título que faz os outros olharem para nós com respeito.

A verdade é que, à medida que a automação e a inteligência artificial ganham terreno, a necessidade de adaptabilidade e agilidade nas organizações torna-se mais premente do que nunca. Portanto, talvez precisemos de parar e pensar: o que realmente significa ter um «emprego» atualmente? E que competências precisamos de ter?

A substituição dos títulos pelas competências

1.Redefinição de valor

– Foco nas Habilidades Em vez de valorizar os cargos, as organizações estão a mudar o seu foco para as habilidades que os colaboradores possuem. Isso significa que um «Gestor de Projetos» pode ser tão valioso quanto um «Analista de Dados» se ambos tiverem as competências necessárias para resolver problemas específicos ou alcançar objetivos estratégicos.

2. Flexibilidade

– Equipas Multidisciplinares As melhores organizações estão a promover a formação de equipas que combinam várias competências, permitindo que os colaboradores trabalhem em diferentes projetos e funções, conforme necessário. Isso cria um ambiente mais dinâmico e adaptável, onde as funções podem evoluir rapidamente em resposta às necessidades do mercado.

3. Aprendizagem Contínua

– Desenvolvimento de Competências À medida que as competências se tornam o centro da discussão, as organizações incentivam a aprendizagem contínua. Isso resulta em investimentos em formação e desenvolvimento, permitindo que os colaboradores adquiram novas habilidades e se ajustem a um ambiente de trabalho em constante mudança.

Implicações para novos modelos de trabalho

1. Organizações Mais Flexíveis

– Estruturas menos hierárquicas As organizações podem passar a ter estruturas mais horizontais, onde as decisões são tomadas com base nas competências dos colaboradores, em vez de se basearem apenas na hierarquia. Isso pode resultar em processos mais rápidos e eficientes, aumentando a capacidade de resposta das organizações.

2. Atração e Retenção de Talentos

– Trabalhadores com mentalidade de crescimento Profissionais que procuram desenvolvimento e aprendizagem constantes podem ser atraídos por organizações que priorizam as competências. Isso ajuda a reter talentos que estão interessados em crescimento profissional e que se sentem valorizados pelas suas habilidades.

3. Mudanças na Avaliação de Desempenho

– Avaliações Baseadas em Competências As avaliações de desempenho podem concentrar-se mais em como os colaboradores aplicam as suas habilidades e menos em métricas de cargo rígidas. Isso pode levar a feedbacks mais construtivos e a um ambiente de trabalho mais colaborativo.

4. Diversidade e Inclusão

– Maior Abertura a Diferentes Perfis A valorização das competências pode permitir que mais pessoas, com formações e experiências variadas, entrem nas organizações. Isso não apenas promove a diversidade, também enriquece o ambiente de trabalho com diferentes perspetivas e abordagens.

Desafios e Considerações

Gestão de Mudança A transição para um modelo baseado em competências pode enfrentar resistência, especialmente de colaboradores que estão acostumados com estruturas tradicionais, e que são mais apegados a títulos e cargos. É essencial implementar estratégias de gestão de mudança eficazes para ajudar na adaptação.

Definição Clara de Competências As organizações devem ser capazes de identificar e definir claramente que competências são necessárias para cada função ou projeto. Isso requer um trabalho contínuo de mapeamento e atualização das competências ao longo do tempo.

Equilíbrio entre Flexibilidade e Estrutura Embora a flexibilidade seja um ponto positivo, as organizações devem encontrar um equilíbrio para garantir que não haja confusão sobre papéis e responsabilidades.

Para profissionais de recursos humanos, gestores e qualquer pessoa que se interesse por transformação organizacional, a mensagem é clara: está na hora de começar a pensar «fora da caixa» (ou do job description, se se preferir). O futuro é das competências, e quem não se adaptar a esta nova realidade corre o risco de ser deixado para trás nas melhores oportunidades e para as organizações mais competitivas.

Em suma, estamos a viver um momento interessante, quase como se estivéssemos a assistir a uma série de ficção científica onde o trabalho está a ser reinventado. E com um toque de sarcasmo, podemos apenas esperar que esta «revolução das competências» não seja apenas mais um «hype» passageiro. Porque, se assim for, só nos restará perguntar: «E agora, quem sou eu sem o meu emprego?»

Lúcia Palma

Corporate partner da Be Agile; professora universitária convidada para as cadeiras de Gestão de Carreira e Recrutamento e Seleção


A Be Agile é uma empresa especializada na aplicação das metodologias Agile em Gestão de Recursos Humanos, Liderança e Cultura Organizacional. De origem portuguesa, trabalha em diferentes geografias, sendo pioneira em abordagens ágeis nos mercados africanos de língua portuguesa. A sua abordagem inclui trazer as frameworks Agile para aplicação nas diferentes áreas de negócio das empresas, e as melhores práticas de felicidade no trabalho para as suas pessoas. A junção destas duas ferramentas, assinala, faz o match perfeito para tornar qualquer organização mais produtiva e com elevado índice de bem estar.

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