Carla Rocha

«A comunicação eficaz começa na escuta.»

Texto: Redação «human» Fotos: Fernando Piçarra

Porque é que é tão importante que nos façamos ouvir? A sociedade atual pede-nos isso, mais do que acontecia há alguns anos?

Uma diferença em relação a há alguns anos é que hoje temos mais canais para nos fazermos ouvir – e mais intensos. Nas redes sociais e nas plataformas digitais as mensagens circulam de forma acelerada, fragmentada, por vezes pouco precisa e muito polarizada. Temos mais liberdade, mas também percebemos que há menos filtros.Temos mais espaço para ser e dizer, mas também assistimos a menos tolerância. Então temos de ativar o nosso sentido crítico. E temos de desenvolver uma forte consciência de como podemos comunicar uma mensagem que seja clara, relevante, que acrescente valor e que seja veículo de empatia e respeito. Somos todos corresponsáveis por criarmos uma sociedade em que seja fértil o terreno da honestidade, da justiça e da verdade.

Num tempo em que a inteligência artificial (IA) surge em força, com as suas ferramentas, com as suas possibilidades, com tantos cenários sobre o futuro, que caminho teremos para uma comunicação como a que nos tem vindo a propor nos seus livros?

O risco, e aqui cingindo-me ao campo da comunicação, é perdermos a autenticidade. Se pensarmos, por exemplo, em ferramentas como o ChatGPT, elas ajudam-nos a criar conteúdos rapidamente, a personalizar mensagens, a elaborar campanhas de comunicação. Mas, muitas vezes, falta-lhes cor, experiências, emoções – falta-lhes o nosso traço único. Não estamos ali completamente espelhados. Temos de fazer esse trabalho – temos de imprimir o nosso cunho, o nosso olhar, o mundo que vemos. As ferramentas de IA são um apoio valioso, mas não nos substituem. Cabe-nos usá-las com discernimento, garantindo que o essencial – a nossa identidade, a nossa visão, a nossa humanidade – não se dilui no processo. E há este ponto interessante: o ChatGPT, por exemplo, dá-nos respostas mais próximas daquilo que pretendemos, quanto melhor for a nossa capacidade de explicar e de colocar questões. Então a IA também nos pode incentivar a sermos mais claros e mais precisos, a fazer as perguntas certas. E isso é essencial na comunicação em que acredito e que defendo.

A certa altura deste novo livro, quando fala da importância da mensagem, apresenta um método com o seu nome. Porque é que o criou e em que é que consiste?

É um método para ajudar cada pessoa a contar mais histórias – para revelar mais de si e tornar as suas mensagens mais autênticas, próximas e eficazes. Sou apaixonada por storytelling e há vários estudos que demonstram – e o campo das neurociências também explica – que uma história bem contada, incluída de forma estratégica num discurso, tem um impacto extraordinário em quem a ouve. Uma história prende a atenção, consegue explicar a essência da mensagem muito melhor do que mil palavras, e perdura na memória. Basta pensar nas histórias que nos contaram na infância. Ainda hoje nos lembramos delas e do efeito que nos provocavam. Há uns anos as histórias estavam muito associadas a este capítulo do entretenimento, e ficavam de fora do mundo empresarial. Então, eu quis primeiro desmistificar e sensibilizar para a importância do storytelling no mundo corporativo; e depois desenvolvi este método para facilitar o processo de criação de histórias. É um método que passa por cinco fases: Recolher (o que acontece na nossa vida ou à nossa volta), Organizar (arrumar a informação e categorizar as histórias), Construir (estruturar a mensagem), Humanizar (a lição que aprendemos e com a qual todos podem aprender) e Aplicar (perceber em que contextos podemos usar as histórias e com que objetivo). É este o método ROCHA.

Concorda com a ideia de que muitas vezes as pessoas têm coisas para dizer e não sabem realmente como dizê-las?

Nem sempre temos as estruturas certas e nem sempre encontramos as palavras que melhor traduzem o nosso raciocínio, garantindo o cuidado com o outro. Sinto que precisamos de investir mais – e desde cedo – na comunicação e no hábito de falar em público, mas também precisamos de criar ambientes seguros para transmitirmos uma ideia ou darmos uma opinião – seja nas nossas casas ou nas nossas empresas. Por vezes, o receio de como o outro vai reagir inibe-nos de dizer o que pensamos. Outras vezes, não nos inibimos, mas também não paramos para refletir sobre a melhor forma de passar a mensagem, e isso pode levar a falhas de interpretação e conflitos desnecessários. Saber o que dizer é importante, mas saber como dizer faz toda a diferença.

Se passarmos para a escrita, a situação piora ou melhora?

Na escrita é igualmente importante termos atenção à estrutura, à forma, às palavras que escolhemos – e também aqui podemos aprender, treinar e melhorar. O que acontece na escrita é que temos mais oportunidades para refletir antes de transmitir a mensagem. Podemos rever e ajustar. Podemos até, num assunto que merece mais cuidado, pedir a alguém de confiança para reler e garantir que um e-mail ou um texto está claro e objetivo. Mas temos sempre este desafio: não conseguir dar um tom de voz ou acrescentar uma expressão facial (embora hoje em dia se possa usar emojis nalgumas situações) para garantir que a mensagem é interpretada com a intenção que lhe queremos dar – e  não temos a possibilidade de fazer o exercício imediato de clarificar ou adaptar o que estamos a dizer conforme a reação que desencadeamos.

Há uma frase do ator João Villaret, sobre o facto de falar mais do que escrever, ou melhor, de praticamente não escrever: «A asneira dita passa, a asneira escrita fica.» Que comentários lhe sugere esta frase, que era dita obviamente num tom humorístico? Será que em determinados contextos a «asneira» ainda que apenas dita não fica na mesma como a escrita?

O que diz João Villaret faz sentido em muitos contextos. A palavra escrita tem um carácter mais permanente e, além disso, pode ser lida fora do contexto original. Algo escrito com uma determinada intenção pode rapidamente tornar-se «asneira» e assim permanecer – e, com o passar dos anos, vamos reler e acabamos por julgar com os olhos do presente. Mas com os meios digitais que temos hoje, a asneira dita também pode perdurar. Um vídeo que é partilhado nas redes sociais ou um comentário num podcast pode ter uma repercussão inesperada. O mundo mudou e o impacto do que dizemos – seja de forma escrita ou falada – pode ser mais duradouro do que imaginamos.

Se tivesse de escolher apenas uma regra da comunicação, como a mais importante, a mais fundamental, conseguia escolher?

Se tivesse de escolher apenas uma, diria: ouvir mais e melhor, antes de falar. Uma das principais lacunas que identifico hoje na comunicação interpessoal é não ouvirmos – é estarmos, muitas vezes, só à espera da nossa vez para falarmos, para mostramos os nossos argumentos e defendermos a nossa posição. Quando ouvimos verdadeiramente, entendemos melhor o outro – o que pensa, as suas expetativas, as suas dores – e adaptamos a nossa mensagem (precisamos de ter essa agilidade). Comunicar não é sobre passar informação ou convencer – é sobre inspirar, envolver e criar ligação com aquela pessoa. A comunicação eficaz começa na escuta.

Primeira parte da entrevista aqui. Segunda parte aqui.

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Carla Rocha é uma referência na formação em comunicação e storytelling, após uma década como consultora, formadora e empresária. A sua voz é uma das mais conhecidas do país, graças a um percurso de 30 anos como locutora no Grupo Renascença, e a inúmeras campanhas de publicidade. Ao longo de anos, adquiriu formação internacional em diferentes áreas da comunicação e da liderança. Integra a National Speakers Association (Estados Unidos) e tornou-se consultora e formadora em empresas e organizações portuguesas e estrangeiras. A par disso, é professora convidada na Nova School of Business and Economics (Nova SBE), no Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) e na Egas Moniz School of Health & Science. Colabora também com a Universidade Católica Portuguesa.

Em 2015, a empreendedora fundou a empresa Carla Rocha Comunicação, especializada em formação e treino de líderes e de equipas, nas áreas da comunicação e da liderança. «Quando comecei era só eu», recorda, para logo assinalar. «Hoje somos 10 pessoas a trabalhar em permanência na empresa e cerca de duas dezenas de formadores e parceiros que se juntam a nós nas academias, nas sessões de formação e nos cursos on-line. Crescemos em pessoas e crescemos na forma como fazemos chegar o nosso propósito aos clientes com que trabalhamos.» É longa a lista de líderes e equipas – nacionais e internacionais – que confiam neste trabalho para transformar a forma como comunicam, resultando em melhorias nas relações e na produtividade. Além das academias «Fale Menos, Comunique Mais» e «Fale Menos, Influencie Mais», a oferta formativa da Carla Rocha Comunicação inclui módulos como Liderança Consciente e Inspiradora, Alinhamento de Equipa, Produtividade e Colaboração, O Poder da Comunicação Intergeracional, Brand Yourself, Estratégias Diferenciadoras de Marca Pessoal, Imagem com Propósito: a imagem como ferramenta de comunicação não verbal e ainda O Poder da Voz – comunique com impacto.

Carla Rocha é autora dos livros «Fale Menos, Comunique Mais» (2016, com relançamento em 2023), «Fale Menos, Influencie Mais» (2019) e «Fale para Ser Ouvido» (2024).

https://carlarocha.pt

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Com a chancela da Planeta, «Fale para Ser Ouvido», de Carla Rocha, mostra como num mundo demasiado ruidoso cada pessoa pode fazer ouvir a sua voz.

A editora apresenta assim o livro: «Falar ou calar? A escolha é sua, mas quando fala deve pensar, organizar as suas ideias e preparar-se, porque só assim será realmente ouvido e alcançará os seus objetivos./ Todos nós estamos em constante interação com os outros, mas será a nossa comunicação eficaz? Somos ouvidos? Conseguimos alcançar os nossos objetivos?/ Quando falamos há questões que devemos colocar e decisões a tomar. Que tipo de comunicador sou? Agressivo ou permissivo? Que tipo de mensagem quero passar? Positiva, motivadora? Quem é a minha audiência? Fiz as perguntas certas para conhecer quem me está a ouvir? Coloquei-as no centro da conversa? Que opiniões devo escutar e quais as que devo ignorar? Quando devo lutar por um argumento e quando devo desistir?/ Carla Rocha, apresentadora de rádio, oradora Ted Talks e consultora de comunicação, reúne neste livro − que irá transformar as suas relações pessoais e profissionais − técnicas e estratégicas que o vão tornar um comunicador eficaz. Habituada a treinar CEOs [chief executive officers], empresários, atletas e outros profissionais, Carla Rocha ensina a tornar as suas conversas mais claras, as reuniões mais assertivas e os seus discursos mais empáticos./ Ensina a comunicar com conta, peso, medida e com intenção. E dá acesso exclusivo ao Método Rocha, onde desvenda todos os segredos de uma das técnicas mais poderosas de comunicação: o storytelling. Porque no fundo todos temos uma história para contar. Só precisamos de saber como contá-la de forma mais eficaz.»

https://www.planetadelivros.pt/livro-fale-para-ser-ouvido/411295

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