Decorrente da globalização, da transformação digital e das novas expectativas dos colaboradores, o desenvolvimento e a retenção de talento assumem, hoje, um papel crítico na competitividade, com sectores a sentirem grandes dificuldades em manter profissionais qualificados e alinhados com os seus objetivos estratégicos.
Texto: Marisa Pardal/ Rui Diniz Miquelis Imagem: Freepik
No dicionário on-line da Porto Editora, «talento» surge definido como «conjunto de aptidões, naturais ou adquiridas, que condicionam o êxito em determinada atividade». No trabalho, este conjunto de aptidões diz respeito às competências técnicas (comummente conhecidas por hard skills)e comportamentais (soft skills) que permitem a um colaborador desempenhar eficazmente uma determinada função, o que, por sua vez, contribui para o sucesso da organização como um todo.
Uma outra definição de talento que encontramos no mesmo dicionário é «antigo peso e moeda de ouro dos Gregos e Romanos», que remete para o facto de o talento ser algo valioso. Desta forma, após estabelecerem de que talento irão necessitar (que competências permitem concretizar a Missão, a Visão e os Valores da organização?), as organizações devem atrair o talento de que necessitam e garantir as condições para que este possa prosperar. Por oposição, perder talento traz, com frequência, instabilidade nas equipas e custos indesejados, associados aos esforços de recrutamento, integração e formação de novos trabalhadores, para além de quebras de produtividade.
Decorrente da globalização, da transformação digital e das novas expectativas dos colaboradores, o desenvolvimento e a retenção de talento assumem, hoje, um papel crítico na competitividade, com sectores a sentirem grandes dificuldades em manter profissionais qualificados e alinhados com os seus objetivos estratégicos.
Com efeito, dependendo da natureza da sua atividade, muitos trabalhadores têm, atualmente, acesso a oportunidades de emprego em qualquer parte do mundo e a um maior número de empresas que, para além de praticarem salários superiores, oferecem benefícios não tão comuns em Portugal, como a flexibilidade horária e a possibilidade de trabalhar remotamente – o que tem contribuído para a proliferação do nomadismo digital. O equilíbrio entre a vida pessoal e profissional e o salário são mesmo apontados como os fatores mais importantes para a motivação dos trabalhadores em Portugal (referidos, respetivamente, por 91% e 90% dos inquiridos), de acordo com um estudo recente da Randstad que envolveu trabalhadores de vários países (ver aqui).
Adicionalmente, muitos profissionais afirmam estar disponíveis para explorar novas oportunidades (77%, segundo um estudo da Hays – ver aqui), o que intensifica a pressão sobre as empresas. De facto, muitos trabalhadores, não obstante possuírem um vínculo estável na organização em que trabalham, estão atentos às oportunidades de trabalho ou até numa procura ativa. A ideia de «emprego para a vida» é uma máxima que deixou de ter aplicação – pelo contrário, assistimos, mais recentemente, ao movimento que tem sido apelidado de The Great Resignation ou Big Quit que caracteriza a saída em massa dos trabalhadores das organizações por sua própria iniciativa.
Por conseguinte, o cenário atual do mercado de trabalho exige que as organizações reforcem as suas estratégias para oferecer condições atrativas, desenvolver competências e criar um ambiente de trabalho que promova o envolvimento e o compromisso a longo prazo.
A capacitação e a retenção do talento estão intimamente ligadas. Numa realidade em constante mudança, capacitar as pessoas é essencial para garantir as competências necessárias para o alcance dos resultados, mas pode, também, ter um impacto positivo na retenção, na medida em que a existência de oportunidades de aprendizagem e desenvolvimento é, frequentemente, apontada como um dos fatores de motivação (ver aqui) para permanecer numa organização. Neste âmbito, podemos incluir ações como a formação, mas também a delegação, o mentoring, o coaching, a criação de academias internas para formar colaboradores em áreas emergentesou a mobilidade interna. Segundo o estudo da SHL «Stay Ahead in 2025», os colaboradores valorizam organizações que lhes proporcionem perspetivas de carreira e que os apoiem na adaptação às mudanças e no desenvolvimento de competências para lidar com os desafios do futuro, permitindo-lhes evoluir e acompanhar os avanços da inteligência artificial (IA).
Outros fatores importantes para a motivação e, consequentemente, a retenção, são o bem-estar, o sentimento de pertença e a liderança inclusiva. Tal como referem Croft, Parks e Whillans (2024), no artigo «Why Workplace Well-Being Programs Don’t Achieve Better Outcomes» da Harvard Business Review, mais do que medidas avulsas, as organizações devem ter uma abordagem sistémica, seja com mudanças estruturais, como a semana dos quatro dias ou variações deste modelo, que tem sido implementado em vários países e cujo projeto-piloto foi bem-sucedido em Portugal (ver aqui), políticas Results-Only Work Environment (ROWE), em que o foco está nos resultados entregues, modelos de carreira que ajudem os colaboradores a visualizar o seu futuro na organização, ou a criação de metas claras e métricas que permitam acompanhar os resultados e ajustar estratégias. Mas também é necessário investir no desenvolvimento das lideranças, incluindo ao nível da inteligência emocional.
No entanto, para que as estratégias de retenção resultem e sejam sustentáveis, as organizações devem adaptá-las ao seu contexto específico, considerando as características da sua força de trabalho, os seus objetivos estratégicos e os desafios que enfrentam. No que diz respeito a políticas de retenção, nada como envolver diretamente os colaboradores, para saber o que realmente os motiva. De facto, para lá dos fatores de motivação que possam ser mais estudados e transversais, as pessoas motivam-se por diferentes fatores (e, mesmo estes, podem variar ao longo da vida), pelo que ouvi-las é a melhor forma de conhecer as suas necessidades e expectativas e, consequentemente, implementar medidas de retenção eficazes.
Tal como em qualquer parceria, em que ambas as partes retiram benefícios e trabalham em conjunto para atingir objetivos comuns, a relação laboral deve ser construída sobre um equilíbrio de expectativas e resultados. Se é essencial que os colaboradores façam um bom trabalho e apresentem resultados, cabe também aos empregadores assegurar que a organização oferece as condições e oportunidades mais alinhadas com as necessidades de quem trabalha diariamente para cumprir os objetivos. Quando ambas as partes se comprometem com a criação de valor mútuo, reduz-se significativamente o risco de perder talento para a porta do lado, que hoje se abre para um mercado cada vez mais vasto e dinâmico.

Marisa Pardal, Head of Training da SHL Portugal
A SHL Portugal é uma empresa de consultoria estratégica e de tecnologia para a gestão do talento, representante das soluções do Grupo SHL, que tem uma posição de destaque mundial em assessment e talent analytics. Opera em cinco países de língua portuguesa e trabalha com centenas de organizações, dos sectores público e privado. Após celebrar 45 anos em 2024, continua a apostar na investigação e na inovação tecnológica aliada à inteligência artificial (IA).

Rui Diniz Miquelis, Associate Lawyer da Vieira de Almeida (VdA)
A sociedade de advogados Vieira de Almeida (VdA) é uma organização vibrante e inquieta, inovadora, que se afirma nas aspirações de um coletivo que quer ser parte ativa da solução para os desafios sociais e ambientais que enfrentamos enquanto sociedade, mobilizando pelo exemplo de respeito, justiça e humanidade. Orgulhosa da sua história, a VdA constrói o futuro assente numa cultura que a distingue e que une em torno de um desígnio comum. Uma cultura fundada na consciência de que a cidadania é a âncora da sua prática e que faz dela uma organização aberta, inclusiva e solidária, focada nas pessoas e na justa oportunidade de realização de cada uma.